GENOMA PESQUISA

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

O TEATRO DE ANTUNES FILHO POR SEBASTIÃO MILARÉ

Pressupostos Teóricos
Complementaridade
O conceito da complementaridade enunciado por Niels Bohr, buscando racionalizar e conciliar a representação clássica dos fenômenos físicos à representação quântica, é básico na estrutura do método. A complementaridade mostrou-se eficiente instrumento de união de linguagens teatrais opostas, bem como ferramenta perfeita para a lida com a inseparabilidade de opostos, presentes em todas as áreas de conhecimento a que o artista de teatro deve lançar mão no seu trabalho cotidiano. Por exemplo: vai se orientar pela psicologia analítica, de olho no inconsciente coletivo, mas sem dispensar a psicologia freudiana, o inconsciente pessoal, a psicanálise. A dialética está implícita no estudo da complementaridade aplicada à criação cênica, assim como elementos da filosofia oriental.
O par arquetipico yin e yang compõe a base, importando na prática o permanente jogo de contrários que imprime dinâmica à ação. E os contrários se harmonizam no âmbito da complementaridade.
Príncipio da incerteza
O princípio da incerteza, formulado por Heisenberg, que parte da natureza dupla (corpuscular/ondulatória) da luz e revela a impossibilidade de separar o objeto observado do processo de observação, em ambiente de velocidade superior à da luz. A “incerteza”, assim com o princípio da “probabilidade”, ao revelar movimentos imperceptíveis aos sentidos, mas que implicam novas formas de realidade, são ferramentas extremamente importantes para o ator na relação com o personagem e com todas as ocorrências cênicas.
Os pressupostos teóricos abrangem uma série de conhecimentos, que incluem disciplinas contemporâneas ainda não aceitas plenamente pela ciência, como o paradigma holográfico, e novas formas de lidar com antigas disciplinas, como a dialética, a retórica, a oratória, chegando às artes marciais e sistemas de idéias orientais, como o hinduísmo, e etc.

Técnica
Preparação Corporal e Vocal
A preparação corporal, a preparação vocal e a técnica da respiração que as une têm função precípua de manter o corpo em estado de relaxamento ativo, buscando a todo momento evitar ou eliminar a ansiedade. Qualquer impulso que chega é imediatamente elaborado, nunca prevalecendo como forma narrativa. Para isso o ator deve estar afastado do personagem e, na mesma medida em que atua, permanece observador, controlando todos os eventos cênicos.
Os exercícios promovem certa desestruturação física, visando liberar o corpo de toxinas (orgânicas, comportamentais ou emocionais), deixando-o em sintonia com o fluxo (li) da Natureza. Os mesmos exercícios proporcionam a flexibilidade físico/espiritual, levando a uma alteração da consciência, de maneira que o ator possa perceber e integrar as imanências da ação dramática através da sensibilidade e da intuição. Ele, o ator, não deve se concentrar em nada, mas estar disponível e alerta permanentemente.
Junto ao conceito taoísta da "mente imóvel" e do par Yin e Yang, outros recursos provenientes das filosofias orientais convergem na base criativa, dando origem a exercícios através dos quais o ator incorpora uma visão cosmogônica e "cria o mundo", dá nome às coisas, o que acentua a condição de hierofania desse teatro intrinsecamente ritualístico.
Imagens Mentais
Há um sistema de imagens induzindo a exercitar o córtex motor, órgão que seleciona e libera impulsos coordenando ações específicas. O gráfico de qualquer movimento, seja físico seja vocal, descreve uma curva, vindo de trás para frente, já que todo o trabalho do intérprete se realiza na ressonância, jamais na projeção.
Há a imagem do vagalume, que capta sinais e os envia para a "casa de máquinas", que é o plexo. Outra imagem é a Grande Mãe, a quem o ator se entrega e que o move como a uma marionete. Aqui se encontra a base do afastamento: enquanto a Grande Mãe o move, o ator permanece no seu eixo, com a "mente imóvel".
Mas, da "casa de máquinas", Leonardo opera seu controle remoto, enviando raios laser que desenham as expressões. Desse modo, a Grande Mãe produz a verticalidade da ação, enquanto Leonardo se encarrega da horizontalidade, que é a narrativa.
Pré-Requisitos
A condição essencial colocada para o ator que pretenda adotar esse método é a expansão e o aprofundamento da sua cultura geral. A habilitação física depende do desenvolvimento intelectual. O processo criativo, nesse caso, tem correspondência no trabalho do físico moderno: conta com dados objetivos, com modelos matemáticos, mas é através de imagens, da imaginação e da intuição que poderá avançar, deslindar novas formas, ampliar o conhecimento. Para isso, cultura é imprescindível. Além, evidentemente, de absoluta disponibilidade física e espiritual.
Sebastião Milaré (crítico de teatro )
TAG: antunes filho

Nenhum comentário: